domingo, 25 de abril de 2010

Recrudesce a violência contra imigrantes em países europeus

Os sentimentos de insegurança e medo entre os imigrantes ilegais nos países europeus de economia “forte” têm se agravado com a crise iniciada em 2008. A verdade é que em períodos de crescimento econômico esses países sempre precisaram de mão-de-obra barata de imigrantes oriundos principalmente dos países antes colônias, que deixam a sua nação de origem evidentemente pela dificuldade de sobrevivência e com a esperança de, apesar das adversidades de uma vida clandestina na Europa, melhorar sua condição e poder ajudar seus familiares. Em decorrência da crise atual, com muitos países estagnados economicamente, os índices de desemprego têm disparado; na Espanha, por exemplo, há estimativas de que o desemprego pode atingir 20% este ano.
Os partidos de extrema direita, como de se esperar, vêm se utilizando desse cenário para transformar os imigrantes em bodes expiatórios. O discurso simplista e martelado é o que já conhecemos: os imigrantes estão roubando o emprego dos europeus, eles são os culpados do desemprego! Com essa falácia racista e xenófoba tais líderes têm fortalecido sua representação política e muitos sido eleitos pela população. É evidente que usam essa linguagem de slogans fascistas, inventando um inimigo próximo, culpando o mais fraco, para através da repetição de um discurso de teor fanático, pautado na aversão ao diferente e na associação de um problema econômico a fatores raciais, adquirirem força política novamente. Não é de hoje que parte da força da extrema direita consiste na capacidade de em momentos de crise incutir em parte da população que um grupo social minoritário é a razão das suas mazelas. Já sabemos muito bem, e os exemplos históricos no continente não são poucos, o que ocorre quando tal linguagem convence a população e acaba por direcionar o seu comportamento.
As leis de imigração têm endurecido em vários países. Jornalistas e grupos de direitos humanos europeus vêm denunciando violações e maus tratos que imigrantes estão sofrendo nesses países. Na Espanha, um imigrante ilegal, se pego, pode ficar encarcerado por até 40 dias, antes de ser deportado, em um presídio para imigrantes junto com pessoas que cometeram furtos e homicídios. O que vem ocorrendo é uma criminalização geral do imigrante ilegal, uma não distinção intencionada entre trabalhador e criminoso. O imigrante que consegue legalizar a sua situação tem que sempre que abordado por autoridades apresentar um cartão que comprova a sua legalidade. Há relatos de maus tratos por parte da polícia com trabalhadores que, por alguma razão, não apresentaram a identificação quando solicitados. A própria situação nos força a traçar paralelos com os momentos históricos de Estados autoritários e xenófobos na Europa.
O crescimento, em andamento, da direita européia terá por tendências dois fenômenos, hoje,  profundamente relacionados: a intensificação da violência contra o imigrante e a solidificação de uma propaganda irracional - nada nova - que aponta causas raciais para problemas econômicos. E é certo que esses são o meios usados pela extrema direita para se justificar no poder e se impor como única alternativa de solução.
Estaria sendo dada atenção crítica suficiente ao recrudescimento de discursos e medidas claramente de teor fascista na Europa em face da crise atual?
Nuvens sombrias pairam sobre o continente europeu...

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Por onde anda Keynes?

O fato de na crise econômica atual os governos dos países desenvolvidos terem despendido grandes somas de dinheiro para salvar o mercado não significa que estamos no começo de um novo keynesianismo. Um pacote de estímulo, como os 780 bilhões de dólares gastos pelo governo dos Estados Unidos para impedir a falência de alguns dos seus principais bancos e empresas, não é o suficiente para considerar essa intervenção estatal como uma medida classicamente keynesiana, como evidência de que a política econômica de livre mercado, desregulamentação e fluxo de capitais implementada sobretudo a partir do início da década de 80 começa, em função das dimensões da atual crise, a ser revista e desacreditada pelos próprios países que arquitetaram o neoliberalismo.
Keynes sabia que qualquer equilíbrio que o mercado encontre entre oferta e procura se dá sempre às custas do pleno emprego. Por isso a necessidade de intervenção do Estado não somente com dinheiro, mas com investimento em infraestrutura e regulação forte do mercado financeiro para, estimulando a economia, gerar emprego em massa e, consequentemente, a demanda por consumo. Em contrapartida, o que estamos vendo atualmente, com exceção da China, é que os países estão dando dinheiro para o mercado sem exigirem grande coisa como contrapartida, tampouco parecem apontar para a direção de estabelecer leis nacionais e internacionais de controle forte sobre as transações financeiras.
A China não sofreu recessão com a crise, continuando a crescer mais de 8% em 2009 em grande parte porque, sendo um Estado dono do seu sistema bancário, pôde empreender facilmente um plano maciço de aumento dos gastos públicos e exigir que os bancos aumentassem o crédito. Mas não vemos a Europa e Estados Unidos apontarem para a mesma direção. Por exemplo, países economicamente fracos da União Européia, como a Grécia, que já atingiu 10% de desemprego em 2010, estão sofrendo pressões da própria Comissão Européia, e portanto dos países europeus ricos, para controlar seus déficits através de cortes dos gastos públicos, sob ameaças de não mais receberem empréstimos. O que é um absurdo como medida para se sair de uma crise, e nada keynesiano. Na verdade, os países ricos sempre puderam aumentar o seu déficit orçamentário para sair de uma recessão. Ao contrário dos países pobres, que sempre sofrem pressão das instituições financeiras, como o FMI, para reduzir os gastos públicos e seus déficits.
Notem também que com a globalização da economia, e o fenômeno de desindustrialização dos países ricos, cujas empresas transferem a produção para os países em desenvolvimento em busca de mão-de-obra barata, incentivos fiscais, flexibilidade das leis trabalhistas e ambientais, etc., o investimento maciço por parte do Estado na economia não significa necessariamente grande geração de emprego e dinheiro na mão do consumidor, pois a maioria da mão de obra das empresas dos países desenvolvidos está nos países periféricos. E mesmo que seja aumentado o poder de consumo da sua população isso não significa que o mercado interno será aquecido e a geração de emprego aumentará consideravelmente.
O que o neoliberalismo criou, e não existia na época de Keynes, foram países em desenvolvimento industrial que crescem às custas de uma exploração da mão de obra barata e cuja produção abastece mercados em várias partes do globo, e países ricos cujas empresas transferem maciçamente seus complexos industriais, em busca de diminuição dos custos, para os países de economia em desenvolvimento.  Vale lembrar que Keynes escreveu nos anos 30, e que em seus escritos procurou encontrar uma saída da recessão que a crise de 29 havia provocada, sobretudo nos Estados Unidos e Europa. Os países periféricos, muitos dentre eles ainda colônias então, não eram uma preocupação no modelo de capitalismo de Estado proposto por Keynes


IMPASSE ECOLÓGICO:  O GRANDE OBSTÁCULO AO MODELO KEYNESIANO

A lógica do capital de superprodução e super-acumulação nos levou ao impasse ambiental atual ao transformar tudo o que é vivo em mercadoria morta. Em face dos impactos ambientais resultantes do nosso modo de produção, falar meramente em desenvolvimento para sair da crise é estar cego para o fato de que a crise atual não é apenas econômica, e que portanto não exige apenas medidas econômicas para ser superada. Tornar mais e mais pessoas consumidores como os estadunidenses além de absurdo, dado serem os países desenvolvidos, em grande parte por causa do seu padrão de consumo, os que mais poluíram e afetaram o ecossistema, é também uma irresponsabilidade imensurável.
A crise é de modelo porque não é apenas interna, mas do impacto do modelo sobre o que lhe é externo. Os recursos naturais não são uma fonte infinita de material para a acumulação “ad infinitum” de capital. O impasse ambiental põe em cheque o próprio modelo capitalista, inclusive até para aqueles que não consideram o desemprego estrutural e o abismo crescente entre ricos e pobres como problemas insuperáveis nos marcos da economia capitalista.
Certamente, em função da sua própria lógica interna, no pós-guerra, com uma Europa destruída, a melhor saída para a economia capitalista superar a recessão foi o investimento na reconstrução da infraestrutura dos Estados. E quando na década de 70, o Estado de bem-estar-social, cuja origem  remonta à políticas econômicas keynesianas iniciadas no pós-guerra, não foi mais interessante para a economia dos países ricos, o que vimos foi uma desmantelação do Estado e dos benefícios que ele criou, de maneira a não frear a acumulação de capital. O contexto atual de desenvolvimento das forças produtivas, de aprofundamento da crise internacional, de desilusão em face do fracasso de outros modelos de produção, como a economia planificada dos países comunistas, chama, como observa o economista filipino Walden Bello, "por uma regulação do mercado financeiro assim como dos mercados de commodities, e um gasto maciço por parte dos governos. Contudo, as necessidades do nosso tempo vão além de medidas keynesianas para abarcar uma distribuição maciça de renda, ataque à pobreza, uma radical transformação das relações de classes, desglobalização, e talvez - mas eu diria necessariamente - uma transcendência do capitalismo sob a ameaça de um cataclisma ambiental".